
Autor: Cláudio Tucci – Advogado e professor. Doutor em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), mestre em Filosofia do Direito e especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental. Bacharel em Direito pela Universidade Paulista (UNIP).
1. Introdução
Segundo a Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/1984), o principal objetivo da pena é assegurar meios para a reintegração do condenado à sociedade. Contudo, ao olhar para a realidade dos presídios brasileiros, a sensação é de que estamos muito distantes desse ideal.
2. Realidade do sistema penitenciário
Hoje, o Brasil possui mais de 830 mil pessoas presas, conforme dados do CNJ (2024), com uma taxa de superlotação de 54%. O sistema é majoritariamente punitivo e pouco voltado à recuperação. Muitas unidades não oferecem trabalho, estudo, assistência jurídica adequada ou tratamento de saúde física e mental.
Essa situação viola não apenas a própria LEP, mas também princípios constitucionais, como a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF) e o direito à individualização da pena (art. 5º, XLVI).
Além disso, a morosidade processual é outro entrave. Muitos presos permanecem tempo maior do que o previsto porque seus processos de progressão, livramento condicional ou remição não são analisados com agilidade.
3. A execução penal além do cárcere
Vale lembrar que a execução penal não se restringe à pena privativa de liberdade. Medidas alternativas, como penas restritivas de direitos, o monitoramento eletrônico e o regime aberto, também fazem parte dessa fase.
Contudo, há uma resistência cultural e institucional quanto à adoção dessas alternativas. Para muitos, “pena que não prende” não tem valor. Essa visão punitivista alimenta um ciclo de encarceramento em massa que, comprovadamente, não reduz a criminalidade.
Segundo André Kehdi, advogado criminalista e presidente do IDDD, “o Brasil precisa entender que o sistema penal não se resume ao encarceramento”. A doutrina moderna defende um direito penal mínimo, voltado à proporcionalidade, legalidade e, sobretudo, à efetividade dos direitos humanos.
4. Possibilidades de avanço
Apesar dos desafios, existem caminhos possíveis. O fortalecimento da Defensoria Pública, a digitalização dos processos e o uso de mutirões carcerários com apoio do CNJ são iniciativas que têm mostrado resultados positivos.
Além disso, o Judiciário pode (e deve) atuar de forma mais proativa, fiscalizando as unidades prisionais e cobrando do poder público a estrutura mínima necessária ao cumprimento da pena de forma digna.
5. Conclusão
A execução penal é mais do que o fim de um processo criminal. Ela representa a forma como o Estado lida com o indivíduo em seu momento mais vulnerável. Se o objetivo é a reintegração, precisamos urgentemente repensar nossas práticas, estruturas e mentalidades.
Não se trata de ser conivente com o crime, mas de fazer justiça e justiça só se faz com humanidade, legalidade e responsabilidade.
Referências
BRASIL. Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984. Institui a Lei de Execução Penal.
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Banco Nacional de Monitoramento de Prisões. 2024.
KEHDI, André. O direito penal e a ilusão do encarceramento. Revista IBCCRIM, São Paulo, 2023.