De olho na notícia: TJ/SP suspende liminar que obrigava o Estado de São Paulo a fornecer o aborto legal em casos de gravidez resultante do crime de violação sexual mediante fraude.

Nohara PaschoalAdvogada. Mestre em Direito Penal pela USP.  Sócia da Paschoal Advogados. Professora do Curso de Segurança Pública da Faculdade VP.

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ/SP), por intermédio da 13ª Câmara de Direito Público, no último dia 20 de outubro, proferiu decisão suspendendo liminar que obrigava o Estado a fornecer o aborto legal nos casos de gravidez resultante da prática de stealthing (retirada do preservativo sem consentimento).

A discussão iniciou-se com uma Ação Popular movida pela Bancada Feminista do PSOL (processo nº 2335112-49.2025.8.26.0000), com o objetivo de obrigar o Centro de Referência da Saúde da Mulher e outros hospitais a realizar o aborto legal para vítimas de stealthing.

Em março de 2025, em sede de primeira instância, houve a concessão da liminar, obrigando o Estado a realizar o aborto, ao fundamento de que embora a prática de stealthing seja tipificado como Violação Sexual Mediante Fraude (Art. 215, CP) e não como Estupro (Art. 213, CP), a gravidez resultante violaria a autonomia sexual da mulher e, por analogia, deveria ser enquadrada na hipótese de aborto legal prevista no Art. 128, II, do Código Penal.

 A suspensão da liminar pelo TJ/SP ocorreu em virtude de recurso apresentado pelo Estado de São Paulo e baseou-se em dois argumentos centrais, um de caráter processual, de inadequação da ação popular como meio apropriado para obrigar o Estado a executar um procedimento de saúde específico e, o outro, que aqui interessa, de caráter material, de negar interpretação extensiva ao artigo que estabelece as hipóteses para o aborto legal.

O art. 128, do Código Penal, estabelece as hipóteses de aborto legal de forma taxativa, quais sejam, risco de vida para a gestante e gravidez resultante de Estupro (Art. 213, do CP)[1].

 Ao cassar a liminar concedida pela primeira instância, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo rejeitou a analogia entre o crime de estupro e o crime de violação sexual mediante fraude, reafirmando o princípio da legalidade estrita no Direito Penal. Para a Corte Estadual, na ausência de lei federal que inclua o Art. 215, do CP, no rol do aborto legal, o Judiciário não pode, por conta própria, criar exceção legal, sob pena de implicar ativismo judicial, com invasão de competência do poder legislativo.

Em síntese, a suspensão resultou da prevalência do princípio da legalidade estrita no Direito Penal brasileiro, que exige que as exceções à punibilidade sejam expressamente previstas em lei. A decisão manteve o procedimento de aborto legal restrito às hipóteses taxativas do Art. 128 do Código Penal, sem incluir, por via judicial, a gravidez decorrente de fraude sexual.


[1] Também na hipótese de anencefalia fetal, em virtude do julgamento da ADPF 54, pelo Supremo Tribunal Federal. 

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