O Crime Organizado e a Realidade Brasileira: Reflexões a Partir da Operação no Rio de Janeiro

Cláudio Tucci Advogado e professor. Doutor em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), mestre em Filosofia do Direito e especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental. Bacharel em Direito pela Universidade Paulista (UNIP).

Introdução

Vivemos hoje uma realidade em que o crime organizado deixou de ser uma ameaça distante para se tornar uma presença concreta e dominante em determinados territórios do Brasil, especialmente nos grandes centros urbanos. A recente operação das Forças de Segurança no Rio de Janeiro, revelou mais uma vez a complexidade e o alcance desse tipo de criminalidade.

Diferente da criminalidade comum, o crime organizado atua com estrutura empresarial, planejamento estratégico e conexão com redes internacionais. Como aponta Valente (2023), trata-se de uma criminalidade adaptada à lógica da globalização, utilizando recursos tecnológicos, estratégias financeiras sofisticadas e uma divisão funcional de tarefas.

2. O Surgimento e a Estrutura das Organizações Criminosas

Historicamente, o crime organizado brasileiro tem origem nos presídios, em especial no Instituto Penal Cândido Mendes, na Ilha Grande (RJ), onde grupos se estruturaram com hierarquia, códigos próprios e um objetivo claro: dominar o tráfico de drogas e armas. A partir dessa base, evoluíram para verdadeiras facções criminosas com atuação nacional e internacional, como o Comando Vermelho (CV) e o Primeiro Comando da Capital (PCC).

Segundo a Convenção da ONU contra o Crime Organizado Transnacional (2000), ratificada no Brasil pelo Decreto nº 5.015/2004, grupo criminoso é “estruturado, composto por três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando de forma concertada com o objetivo de cometer crimes graves, visando lucro ou outro benefício material”.

3. O Contexto Atual: A Operação no Rio de Janeiro

A megaoperação no Rio de Janeiro, com foco nas comunidades da zona norte dominadas por milícias e facções, expôs o poder de intimidação e controle territorial desses grupos, capazes de paralisar o funcionamento do comércio local, impor toques de recolher e eliminar rivais e agentes públicos.

De acordo com dados oficiais da operação mais de 121 pessoas (criminosos) foram mortas no confronto e 04 membros das forças de segurança morreram. A operação envolveu inteligência integrada, uso de drones entre outras estratégias  evidenciando que, sem tecnologia, o Estado dificilmente enfrentaria esse inimigo invisível e multifacetado.

4. Legislação e Limites: O Que Diz o Direito?

No Brasil, a Lei nº 12.850/2013 é a principal norma que define e regula o crime organizado. Ela conceitua organização criminosa como “a associação de quatro ou mais pessoas, estruturada e com divisão de tarefas, com o objetivo de obter vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a quatro anos”.

Esse arcabouço legal, embora mais completo do que o anterior (Lei 9.034/95 que definia quadrilha ou bando), ainda enfrenta dificuldades operacionais e judiciais, sobretudo pela complexidade das provas e a necessária articulação entre polícia, Ministério Público e Poder Judiciário.

Além disso, o uso de instrumentos como delação premiada, interceptação ambiental e infiltração de agentes deve ser cercado de garantias legais, para evitar abusos e preservar o devido processo legal.

5. Considerações Finais

O combate ao crime organizado não se esgota com operações pontuais, por mais bem planejadas que sejam. É preciso investir em inteligência, integração entre as polícias, fortalecimento das instituições de justiça e principalmente em políticas públicas sociais que retirem do crime a sua principal fonte de poder: o domínio sobre territórios vulneráveis e carentes de presença estatal.

A atual operação no Rio de Janeiro é um alerta e, ao mesmo tempo, uma janela de oportunidade para repensar o modelo de segurança pública no país. Como bem observou o jurista Luiz Flávio Gomes, “o Estado precisa vencer a lógica da guerra e entrar na lógica da governança”.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Art. 144. Disponível: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm

Acesso em: 11 out. 2025.

BRASIL. Lei nº 12.850, de 2 de agosto de 2013. Define organização criminosa e dispõe sobre investigação criminal. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 5 ago. 2013.

BRASIL. Decreto nº 5.015, de 12 de março de 2004. Promulga a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 13 mar. 2004.

VALENTE, João Bosco Sá. Crime Organizado: uma abordagem a partir do seu surgimento no mundo e no Brasil.

GOMES, Luiz Flávio. Combate ao Crime Organizado: um novo paradigma para o Brasil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019.

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