
Cláudio Tucci – Advogado e professor. Doutor em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), mestre em Filosofia do Direito e especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental. Bacharel em Direito pela Universidade Paulista (UNIP).
Introdução
A segurança pública é um dos temas mais sensíveis da vida em sociedade. Mais do que um conceito jurídico, ela representa a forma como o Estado garante a ordem, protege o cidadão e preserva os direitos fundamentais. Mas afinal, o que diz a Constituição de 1988 sobre isso?
Muitos associam segurança apenas à repressão policial, mas o texto constitucional vai além. Com a Emenda Constitucional nº 104/2019, que incluiu a Polícia Penal como órgão oficial, o sistema ganhou um novo contorno, reforçando a ideia de que a segurança pública exige não só repressão, mas também gestão, inteligência e integração.
2 – O que diz a Constituição: Art. 144
O artigo 144 da Constituição Federal estabelece, de forma clara, a estrutura da segurança pública no país. Veja o texto literal e atualizado, com base na redação vigente até 2025, conforme o site oficial do Planalto:
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
I – polícia federal;
II – polícia rodoviária federal;
III – polícia ferroviária federal;
IV – polícias civis;
V – polícias militares e corpos de bombeiros militares;
VI – polícias penais federal, estaduais e distrital.
§ 8º Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei.
Esse ensaio é central para a compreensão do sistema de segurança no Brasil. Ao reconhecê-lo como direito e responsabilidade de todos, a Constituição amplia a visão tradicional e incentiva uma abordagem mais democrática e integrada.
3 – Doutrina e críticas ao modelo vigente
Apesar da previsão constitucional, o modelo prático ainda apresenta falhas. O jurista Luiz Flávio Gomes destacou que o art. 144, embora importante, não cria um sistema articulado. Para ele, listar órgãos sem estabelecer integração efetiva resulta em sobreposição de funções, baixa eficiência e pouca cooperação entre esferas.
A Emenda Constitucional nº 104/2019 buscou corrigir parte dessa lacuna, ao elevar as polícias penais ao mesmo patamar constitucional das demais corporações. Isso trouxe maior autonomia, identidade funcional e reconhecimento institucional para os profissionais que atuam diretamente no sistema prisional.
Segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro, a segurança pública deve ser tratada como serviço público essencial, regido por princípios como eficiência, continuidade e universalidade, o que exige planejamento, estrutura e responsabilidade.
4 – Desafios e caminhos possíveis
O principal desafio segue sendo a fragmentação entre os órgãos de segurança, que muitas vezes atuam de forma isolada. A Lei nº 13.675/2018, que criou o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), tenta promover a integração, mas sua efetivação ainda é limitada.
Além disso, enfrentamos:
Falta de investimentos em formação e inteligência;
Excesso de enfoque em ações repressivas em detrimento da prevenção;
Estrutura desigual entre estados e municípios;
Baixa valorização da atuação cidadã da segurança.
Apesar disso, há avanços importantes, como a consolidação das guardas municipais, o fortalecimento da Polícia Penal e a expansão de programas de policiamento comunitário.
5 – Conclusão
A Constituição de 1988 estabeleceu as bases para um modelo de segurança pública moderno, democrático e participativo. A inclusão da Polícia Penal reforça a ideia de que a segurança vai além da atuação ostensiva: ela passa também pela gestão do sistema prisional, que é parte essencial do ciclo penal.
Mais do que repressão, a segurança pública deve garantir direitos, ordem e dignidade. O desafio, portanto, está em tornar o que está na Constituição uma realidade efetiva para todos os brasileiros.
Referências
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Atualizada até a Emenda Constitucional nº 115, de 2022. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
Acesso em: 3 out. 2025.
BRASIL. Emenda Constitucional nº 104, de 4 de dezembro de 2019. Acrescenta o inciso VI ao caput do art. 144 da Constituição Federal, para instituir as polícias penais. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 5 dez. 2019.
BRASIL. Lei nº 13.675, de 11 de junho de 2018. Institui o Sistema Único de Segurança Pública (Susp). Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 12 jun. 2018.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 35. ed. São Paulo: Atlas, 2022.
GOMES, Luiz Flávio. Sistema de segurança pública: desafios e alternativas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019.